dezembro 23, 2005

Proposta de Natal

Há doze meses, defini o Natal como tempo de pensar o bem, desejar o bem e praticar o bem. Propus um renascimento coletivo e, meio que nas entrelinhas, uma renovação de espírito.

Há vinte e quatro meses, refleti sobre o espírito natalino. Abri meu coração para cada mensagem de Natal, cada abraço, pensamento ou atitude natalina.

Hoje, estou aqui tentando não cair na redundância, escapar dela e inovar. Tudo em vão porque os desejos continuam os mesmos, a necessidade de paz continua a mesma, as pessoas continuam precisando se espiritualizar cada vez mais e o significado do 25 de dezembro é o mesmo de há 2006 anos.

Por isso, agora não quero desejar. Quero propor, você aí se compromete? Quero propor mudanças, experiências, atitudes do bem: uma mudança de hábito, alguns sorrisos a mais no rosto, uma nova idéia na cabeça, um pensamento positivo, um “eu te amo” inesperado, qualquer coisa que cause efeito nessa pessoa aí do seu lado.

Quero propor que você, meu amigo do peito, acenda a sua estrelinha e entenda que o brilho próprio dela é você. Lute pela sua causa, pelo seu mundo melhor, para ser a diferença nele. O Irmão lá de cima vai te ajudar, mas não se esqueça de que você é responsável por traçar a estratégia.

A minha proposta é que você alcance o seu sucesso; que você conquiste novos amigos, que você descubra novos amores; que você torne-se saudável.

O seu 2006 poderá ser diferente, depende de você.

Aqui, a minha proposta de um FELIZ NATAL e de um 2006 MÁGICO.

novembro 16, 2005

Hóspede do tempo

(Fred Martins/Zélia Duncan)

Sou hóspede do tempo
Da minha casa
Das minhas palavras
Das coisas que eu declaro minhas
Inquilina da vida que me foi dada
Portanto nada
Ficou na minha bagagem
Do velho brinquedo
Que já não me ilude
O que eu tenho é minha atitude
O que eu levo é minha atitude
O que pesa é minha atitude
Minha porção maior

setembro 25, 2005

Fique

Passaste por mim e deixaste lembranças. Sim, eu ainda as tenho – lembranças. Esquecida que sou, me esqueci de esquecer-te. E querer-te ainda está nos meus planos. Se tenho tuas lembranças, ainda tenho tu.
E tu, beleza encantadora, ainda és minha. Não tenho apenas lembranças. Mais que isso: tenho esperanças. Tudo o que preciso agora.

setembro 21, 2005

Escuro

Fecho os olhos e me enxergo melhor. Assim como Malte Laurids Brigge, que começou a ver aos vinte e oito anos, também eu comecei a ver já crescida, aos vinte e três. Fecho os olhos e deixo a lógica conduzir meus pensamentos. Logo eu, que jamais permiti ao meu lado humano transcender as barreiras do real e absoluto. Vejo melhor agora, sim, mas ainda de olhos fechados. Talvez algum dia eu os abra. Quando a minha visão míope não me incomodar mais. Aos trinta e três, será? Agora, preciso agora! Alguém me ensina a sentir?

setembro 20, 2005

E esse "não", o que é?

Agora que você veio, não quero mais. Pode ir, pode ir. Vá! Não te quero aqui. Não consigo. Não posso. Quero. Quero minha paz de volta. Minha cabeça no lugar de sempre. Quero minhas dúvidas comigo. Não essas, as outras. Quero meu coração inteiro,
batendo Zélia Duncan e não Maria Bethânia. Isso aqui não tem serventia, me diz? Leve tudo: meu desejo, meus óculos, meus sapatos. As canções. Deixe apenas meu sorriso - aquele que te cumprimentou pela primeira vez - e a linda imagem de canto do olho.

setembro 19, 2005

A luz da estrela mais linda que sorri em sua constelação

Como expor certas coisas sem parecer clichê? Dizer e redizer tudo o que já foi dito pelos outros sobre esse tipo de coisa que poderia ser tão bem dita por você mesma? Nessas horas, se arrepender é fácil e quase imprescindível. Rever certos conceitos também. Mas é inevitável não ser hipócrita e não enxergar a covardia que brota dos poros. Milagres existem? Estão por aí? Ofereço tudo o que tenho por um deles. Aceito empréstimo, consignação, permuta ou qualquer outra proposta que faça isso acontecer de uma vez. Que faça ser tão perfeito como espero que seja, que, assim como estas palavras que saem facilmente, simplesmente aconteça. Aconteça e faça brilhar essa mágica que me faz desligar do mundo e esquecer de certas importâncias. É forte, muito forte. E está começando a doer. Meu medo é que isso vá além do que parece possível. E se não for possível eu suportar? Não suportar também é clichê? Danem-se os clichês! Aos diabos com os medos! Uma gota de coragem e é tudo. Tudo para trazer sol às trevas. E eu só gostaria de saber como isso aconteceu. Veio assim, sem avisar. Do nada! E não está me levando à nada senão às expectativas de quem espera sentada. De quem em sua espiritualidade ainda acredita em milagres. De quem, mesmo diante de toda grandiosidade, insiste em não aceitar. De quem nunca sentira isso antes. De quem nunca mais vai rir ou duvidar ou julgar. Será que isso é? E agora?

setembro 11, 2005

(...) Pois versos não são, como as pessoas imaginam, sentimentos (a esses, temos cedo demais) - são experiências. E por causa de um verso é preciso ver muitas cidades, pessoas e coisas, é preciso conhecer bichos, é preciso sentir como voam os pássaros, e saber com que gestos flores diminutas se abrem ao amanhecer. (...)

(trecho de "Os Cadernos de Malte Laurids Brigge", de Rainer Maria Rilke)

agosto 28, 2005

O Eu

Voltar à minha subjetividade me faz bem. Permite que eu mesma toque o ritmo da minha vida, sem liberdades concedidas. Aproxima as minhas respostas e torna os meus anseios compreensíveis. E eu fico assim, “lispectoriana”, enquanto as pessoas se perdem em seus porquês. Afundada num egoísmo merecido e bom, eu consigo fazer poesia sem pretensão. Consigo até um tempo que é só meu, mesmo com o mundo à volta prosseguindo em seu percurso. E me cubro de uma espiritualidade em evolução. As minhas expectativas me acalmam porque, mesmo ainda não sendo fatos, são expectativas. Tudo devidamente mensurável, coberto de uma “trilha sonora duncaniana”. E basta.

julho 27, 2005

O Portuga, o Circo e a Verdadeira Verdade

Sabe de uma coisa? Lembro-me como se fosse hoje, de pessoas olhando sério para mim e dizendo que não votariam num cara que mal sabe falar o bom e velho Português. Engoli um seco qualquer que encontrei na região da garganta e fiquei em silêncio. Não pude deixar de enxergar uma certa opinião do contra nos olhos de quem discursava. A questão ali estava óbvia: não era o Português que incomodava, era o Lula.

Pois bem. Como bem reza a nossa política desde os primórdios até hoje em dia, para entender suas verdades e mentiras, dê uma zapeada na Globo. Para seguir o fluxo, deixei as minhas super séries favoritas de lado ontem e coloquei-me a assistir ao Jornal Nacional. Antes, permita-me um adendo: você não acha que o Jornal Nacional, ao menos neste período, deveria chamar-se "Jornal da CPI"? Ahan, eu também acho. O noticiário inteiro foi sobre o escândalo político, exceto pela queimada criminosa que ocorreu lá nas matas da região do Pará. O responsável, já identificado, poderá pegar de 3 meses a 1 ano de prisão, além de ter sido multado em 20 milhões de Reais. Não, eu não entendi errado. Fiquei pensando no que poderá acontecer com ele, além de perder sua fazenda, todos os seus bens, suas economias, suas roupas e até sua cueca. Fui mais além: será que sua dívida se estenderá para seus filhos, netos, bisnetos, tataranetos, etc.? Sério, o homem foi errado. Criminoso mesmo. Mas por que multá-lo com um montante deste sendo que é óbvio que ele nunca conseguirá pagar? Isso se transformaria numa "Dívida Interna Familiar". Bizarro! Ops. Acho que acabei fazendo dois adendos.

Continuando: na minha empreitada, assistindo ao Jornal Nacional, lembro-me bem de um episódio: um dos integrantes da CPI questionava o Presidente da Comissão quanto à dificuldade de acesso aos documentos de investigação dos envolvidos, criticando os métodos de apuração dos fatos. O moço estava bravo com a senhora esposa do empresário Marcos Valério, e aproveitou seu momento de fúria para despejar umas verdades aos superiores. Ou ele tinha razão. Ou ele estava querendo alguma espécie de promoção. Ou tudo fazia parte do script. Isso sim é uma genuína comédia. Hollyood não chega aos pés do circo político brasileiro, vai por mim. O então Presidente, com um olhar furioso, fitou-o seriamente e lançou: "Recebo estas afirmações com uma grande indgnidade". Indignidade? Indignidade?? A gente sabe que indgnidade ampara 99% das pessoas ali presentes, mas... Indignidade??? Só faltaram aquelas gargalhadas artificiais de fundo, sabe? Aquelas que a gente ouve quando assiste Chaves. Pois é.

Voltando ao meu primeiro parágrafo, que Lula, que nada! O bom e o velho Português não é sabido por ninguém. Falta mais construção em nossos argumentos e ainda mais atenção nas nossas escolhas políticas. Atenção naquilo que é colocado como prioridade, manja? Está a fim de saber a verdadeira verdade? Mesmo?! Educação deixou de ser prestígio da elite há muito tempo. Quer prestígio? Arrume um mensalão e comece a fazer os seus desejos.

julho 26, 2005

ET disse:

Ju,
Muitas pessoas me escreveram mas certamente vc foi a única que me fez rir :))
Thks menina do sorriso,
et


E eu respondo:

Então, pegue aí mais um sorriso pra você!

julho 13, 2005

JERÔNIMO, O MATADOR

(Desabafo concedido ao amigo Marcelino)

Não. Não vou falar aqui hoje da viagem a Paraty, da festa literária, essas coisas. Novidades e fofocas e graças outras que eu terei, juro, prazer em contar a partir de quinta-feira e saravá.

Falarei do Jerônimo, o Matador. Nada a ver com o Jerônimo, o Herói do Sertão, série que passou na televisão na década de 60 e 70 e 80. Esse, o nosso primeiro herói brazuca, pândego, à luta.

Falo de um outro. Cabreiro, sorrateiro e que me entrevistou (eu e o Ademir Assunção - leia também o que falou Ademir clicando aqui) para a revista Veja desta semana. Falando acerca do Movimento Literatura Urgente, do qual sou um dos "membros de primeira hora", como noticiou ele e eta!

O olhar do Jerônimo (de sobrenome Teixeira) era frio, longínquo. Como se tivesse me raptado, eu no cativeiro. "Cativeiro", isso mesmo. Jerônimo me ligou para marcar um papo sobre dois assuntos, segundo ele: o Literatura Urgente e os meus Contos Negreiros.

Estranhei: o que tem a ver o cu com a cara da carranca? Respondeu-me, cheio de artimanha: você é um dos "líderes" do Movimento. E mais: farei uma lincagem, na reportagem, com o lançamento do seu novo trabalho. Não acreditei. Não pode ser verdade. Comentei com o Ademir. Mas vamos lá. Não fujo dos meus algozes. Até espero que eles gozem primeiro.

E foi no que deu: o cara perguntou tudo e molecou as respostas, minhas e as do Ademir, a serviço do seu discurso. Seu não, o da revista. Não é à toa que lá, ao lado da matéria de uma página inteira, note, há uma outra, assinada também por ele, sobre outro nazista, o Adolfo Hitler. Confira, se puder. Mas não compre a revista.

Sigamos.

Falei para ele que nós, sobretudo, nos organizamos, assim, porque nunca nos sentimos representados pelas instituições que, digamos, estão aí para nos "representar". Entendam: são elas que são procuradas quando o assunto é Fundo, Feiras e Falecimentos. Falo da ABL, por exemplo. E da UBE. Essa última, simpatica e simpatizantemente presente nas duas últimas reuniões que tivemos. E onde o Jerônimo também esteve, me disse. Infiltrado, ele, no Movimento.

Por que não aproveitou, então, a ocasião para levantar as questões a todos os presentes? Colaborar para o amadurecimento das nossas reivindicações, sempre abertas à discussão? Não. Jerônimo é um assassino eficaz. Acompanha as vítimas, anota, estuda cada uma, passo a passo. É pago para espionar. O negócio é cortar as cabeças.

Estamos ou não estamos no tempo de cuecas e malas? Daqui a pouco, veremos escritores comprando terrenos e casas. Fugindo para Frankfurt etc. e tal. Conhecendo tudo que é paraíso fiscal. Não. A revista Veja não vai deixar. Logo ela que, desde a época da ditadura, zela pela nossa conduta exemplar.

Até falei: não entendo as perguntas que você me pergunta, pá, pá, pá. Parece que a gente é um bando de corrupto. Falcatrua na literatura. Porra! Não é nada disso. É essa, apenas, a primeira vez em que os escritores se sentam para confabular. Avançar em algumas questões. Clamar por algumas responsabilidades. Por exemplo: como melhor utilizar a estrutura já montada das universidades. O escritor ir para discutir a sua obra com os alunos por aí. Como acontece em outros países. Até nos mais pobres que o nosso, a exemplo de Cuba.

E os nossos consulados pelo mundo, falei para ele. Por que não realizam nenhum intercâmbio, Jerônimo? É coisa fácil e não carece de muito dinheiro. E o Jerônimo entendia, matreiro: câmbio. Eu dizia intercâmbio. E ele: câmbio, câmbio, câmbio. Não, não estou falando de dólares. Estou falando de um projeto básico. De bolsas de criação, como a extinta Vitae. Jerônimo, você é muito novo para esse olhar incrédulo. Repito: hitlerista.

Jerônimo não quer ouvir. Mandaram o cara atirar. E ele foi lá, fazer o serviço. Tudo bem, mas por que não ouvir humana e honestamente os nossos argumentos? As nossas falhas estampadas? Disse eu: cara, a gente não está dizendo que é o dono da verdade. A gente só quer saber por que o escritor nunca é ouvido nesses casos. Não somos, a maioria, tratados com dignidade. Que é isso? O nosso trem não é da "alegria", cara. É do fracasso.

Por isso muita gente tem se organizado. Em Belo Horizonte, Santos, Londrina, Curitiba. Porra, ninguém vive aqui com a bunda na cadeira, esperando (do imortal) a morte alheia. A gente quer ir à labuta, é isso. Ninguém é, escreve aí: filho da puta. Enumerei tantos trabalhos importantes (encontros, livros, antologias, festivais) que fizeram tantos autores que estão na lista do Movimento. Sem nunca esperarem por nada. Alguns dos quais a sua revista é doida para jogar no esquecimento.

Jerônimo ficava em silêncio. Vendo a minha agonia. Sem dominar um vocabulário político. Era outra, ali, a minha energia. Indagações e angústias que me levaram ao Movimento. Não como um dos líderes, discordei. Mas como um dos mais inconformados.

Jerônimo, é bem verdade, perguntou sobre os meus Contos Negreiros. Mas já era tarde. Não conseguiu dissimular o desinteresse. Tocou no tema, forçosamente. A saber: por que você trata sempre de personagens miseráveis e trabalha em um dos prédios mais chiques de São Paulo (próximo do café onde a entrevista foi feita)?

"Quanto mais miserável o escritor melhor", parecia dizer Jerônimo, o Matador.

E disse e atirou.

Pensando ele que nos matou.

Marcelino Freire

junho 28, 2005

Ânsia

Questionamentos.
próximos, distantes;
comuns, insensatos;
sutis, paralelos;
incertos, exatos.
Paradoxais.

Tal qual a incompreensão da música de fundo.
Tal qual o objetivo que nasce em minh'alma
E morre por tanto querer ser objetivo.

À minha frente, gente.
Ao meu lado, gente.
Em minha vontade de fuga, gente.
O querer ficar, gente.

Questionamentos afoitos.
Daqueles de querer arrancar o que está bem aqui.
O que jamais se teve certeza de que realmente esteve ali.
De querer destruir o auto-falante de onde ecoa
Essa voz concentrada
Que insiste em me desconcentrar.

Daqui pra frente, amanhã.
Vontade de dormir, amanhã.
Sede de seguir, amanhã.
Despedir, talvez, amanhã.

Questionamentos aspirantes.
Iguais aos botões de rosas do jardim -
Aqueles que pensaste ser azuis.
Iguais, sim, à música que toca agora.
Bendito seja o som que nunca ouvi
E que me trará todas as respostas.

Revelar o que se vê, amor.
Sustentar o que se sente, amor.
Desvendar o desconhecido, amor.
Ser o que se é, amor.

junho 14, 2005

23 Anos de Momentos

Certos momentos da vida, você pára, olha pra cima, dá aquela coçadinha na cabeça e sutilmente olha pra trás. Assim, disfarçadamente, com uma certa timidez, como quem não quer acordar nenhum fantasma. Então, você percebe que nem sempre olhar pra frente ou pra trás causa algum efeito substancial pra quem simplesmente caminha. A vida está aí na maratona, do seu ladinho. Às vezes, ultrapassa com um sorrisinho irônico e você nem percebe. Outras, passa como um furacão e quando você se dá conta, já foi.

Tem gente que chega aos vinte e três anos e fica se perguntando o que há de tão especial nisso. Tem gente que se desespera e finge que não está vendo. Tem gente que fica saudosista. Tem gente que não percebe que está lá. E tem gente que comemora, chuta o pau da barraca e continua levando. Acho que, no meu caso, coloco tudo isso aí num liqüidificador, faço uma vitamina daquelas e vou ingerindo em pequenas doses, day after day.

Mas olhar pra trás é inevitável. É a única viagem que você realmente consegue realizar só e com apreensão. Você pega uma nave espacial, vai até os cinco anos de idade, quando andava na rua segurando forte a mão do seu pai, como se o simples fato de segurar sua mão criasse um campo de força que o protegeria contra todas as forças do mal. Você retorna para a nave e vai uns dois anos adiante, quando pergunta pra sua mãe o que sigifica motel, porque viu escrito em letras garrafais num muro qualquer. E, lógico, acredita quando ela responde que é um lugar aonde vende madeira. Você segue na nave, num período bem confuso da sua vida, quando esquece o diário debaixo da carteira na escola, o que faz com ele pare nas mãos daquela professora que deixa bem claro que ele foi lido. Ainda queimando de vergonha, você entra na nave rapidinho e pára num período não muito distante, quando consegue o primeiro emprego e entra na faculdade. Então, você saca que todas aquelas estradas que ficaram lá atrás, momentos de afetos com irmãos, de diversão com os amigos da rua, de saborear o doce de leite da avó, de ter a redação lida na sala de aula, o primeiro show, o primeiro beijo, momentos que compuseram a pessoa que você se tornou hoje, não ficaram lá atrás. Momentos assim não passam. O ser humano é um quebra-cabeça de momentos. De infinitos momentos e é por isso que as pessoas não conseguem se entender e se decifrar verdadeiramente. Todos esses momentos não somem, não passam, não ficam no meio do caminho. Os momentos vão com a gente aonde quer que pensemos em ir.

Chegar aos vinte e três me fez perceber que não é tão ruim assim. Me permitiu perceber que nem sempre os melhores arquitetos assinam os melhores momentos. E que os melhores momentos nem sempre estão nos lugares mais bonitos. Mas me abriu os olhos. Me fez entender que entre ter vinte e três e oitenta e dois anos não há a menor diferença. Porque nunca é tarde para se criar bons momentos.

Quero agradecer aos meus amigos e todos que me acompanham e torcem por mim, por contribuírem com seus tijolinhos para a construção de momentos tão especiais na minha vida.

maio 28, 2005

Sim-sa-la-bim

Feriados prolongados passados em casa, caminhando pra lá e pra cá, oscilando entre a TV e a Internet, com uma ou duas páginas de um livro qualquer lidas, em que as músicas tristes deixam você triste e as alegres também – afinal, está em casa - , dias assim faz com que você tenha algumas idéias. Nada original, vou logo avisando. Vi isso uma vez no blogue do Tony. Para completar, a entrevista alguns posts abaixo que, cá entre nós, me transformou num ser deveras fútil, fez com que viesse uma luzinha meio cor-de-rosa na minha pobre cabeça. Seguinte: vou entrevistar os meus amigos. Os poucos que visitam este blogue e os da vida real. É isso. Nos próximos posts, vocês saberão o que pensam os amigos dessa que vos escreve. E, baseados naquele ditado “diga-me com quem andas que lhe direis que és”, vocês terão certeza sobre o que realmente sou. Ou penso ser. Ou tento ser. Ou sei lá o quê. Aguardem!

maio 26, 2005



Algumas autodenominações podem fazer jus à pessoa, mas nem sempre ao momento pelo qual essa mesma pessoa passa. Repensando a minha saga de pobre consumidora pop, devo dizer que este é um título que me remete a uma triste realidade. Gasto muito e me sobra pouco.

Peraí, vocês não estão entendendo nada. Calma aí, minha gente. Explico: estamos em pleno feriadão prolongado e o fato é que estou sem grana. Zerada. Durinha Marciano da Silva. Irei contra todos os meus instintos - e eu tenho vários, acreditem -, e ficarei em casa vendo novela e todas as minhas super séries favoritas. Vou aproveitar para dormir bastante e para fazer todas as minhas lições de inglês, pois minha teacher disse que se eu não entregar tudo o que devo na próxima aula serei reprovada. Cá entre nós, eu NUNCA entrego. Imaginem uma coisa dessas.

Isso aí em cima eu escrevi ontem, quando comecei este texto. Mentira. Não é um texto exclusivo para o Proseando. Trata-se de uma adaptação a uma resposta minha a uns amigos querendo combinar o feriado comigo. Então percebi que a resposta daria um belo post. Como vocês tem percebido, não tenho sido nada criativa ultimamente. A vida tem me consumido muito rápido e nem mesmo observadora eu sou mais. O post está meio sem pé nem cabeça, tal qual os meus propósitos, mas dá pra ser postado.

Hoje é o aniversário da Clarah Averbuck. Mandei um e-mail pra ela. Ei, Clarah, parabéns pra você! Não vou à sua festa “do caralho”. Se bem que rock na cabeça é tudo o que preciso no momento. Claro, com algo bem forte pra beber e fazer tudo girar e as palavras escaparem da boca pra nunca mais voltarem. Aí, eu até fumaria um ou dois cigarros, mesmo que me deixassem com ânsia de vômito depois. Mas não vai dar. Então, voltarei pra minha solidão. Vou nessa. Vai começar a 11ª temporada de E.R.. Até a próxima. Prometo que volto mais sóbria.

maio 05, 2005

Entrevista concedida à Dotz para a Coluna Social da Semana

“Espero continuar dando tudo de mim”

“Não pretendo casar e nem ter um filho”

“Gasto em tudo. Sou consumidora Pop”

Juliana Marciano, 23 anos, gosta muito de escrever e mais ainda de falar. Muito comuni-cativa, ela concede entrevista contando tudo nos mínimos detalhes e, assim, revela sua vida, suas preferências e seus planos para o futuro, que se baseiam em ser uma grande escritora famosa. Ju, como é seu apelido, mora no bairro Jardim Rey, em Diadema. Do signo de gêmeos, ela mora com a mãe Isa e tem o pai Antônio morando no mesmo quintal com outra esposa, história essa que Ju relata ao decorrer da entrevista, assim como outros fatos a seguir.

Comida: Gosto muito de massas, comida japonesa, e também gosto muito de comer “porcarias”. Às vezes vou no Mc’Donalds e como um Mc Lanche Feliz só para ver a surpresa, sou uma consumidora Pop.

Música: É minha paixão. Eu gosto de MPB, clássicos como Elis Regina, Tom Jobim, Chico Buarque. Mas o que eu prefiro mesmo são de cantoras que nunca ninguém ouviu falar, assim como Isabella Tavani, Marcela Biasi e Renata Gebara. Elas são do Rio de Janeiro e ficam sem espaço para cantar em outros Estados, isso porque no Rio o movimento musical é mais forte. Mas, no momento, estou gostando muito da Zélia Duncan porque a acho uma artista completa. Para cantora internacional não tenho muita preferência porque tenho difi-culdades com inglês então fico sem entender algumas letras. Gosto muito de música italiana, por isso quinta-feira fui no Show da Laura Pauzini, no Credicard Hall.

Time de Futebol: Não gosto de futebol, mas eu dizia que era torcedora do São Paulo. Acho futebol uma coisa estranha, vários homens correndo atrás de uma bola (risos).

Animais de estimação: Eu tinha dois peixinhos, o Tom e a Elis (em homenagem aos cantores). O Tom morreu primeiro e depois a Elis morreu porque a tampa do aquário caiu em cima dela. Agora eu tenho um outro peixinho chamado Luz, que foi minha mãe que deu esse nome.

Sonho: Não tenho sonhos. Acho que a gente vive de momentos, é o que eu almejo hoje. Não tenho um sonho de ter um carro, de casar, ter uma família. Ah, não...não...eu tenho um sonho sim, eu sonho em ser uma escritora famosa e fazer o lançamento do meu livro com muitos amigos e regado a vinho barato. Minha amiga sugeriu de fazer o lançamento do meu livro com pipoca, porque é barato e bem moderno (risos).

Mora com quem: Olha só, moro com minha mãe mas meu pai mora no mesmo quintal com a esposa dele. É uma longa história, vou contar. Era uma vez um mocinho que se apaixonou por uma mocinha e casou-se com ela e teve 3 filhos, o Ivan, o Fábio e a Neide. Aí, em um belo dia, aconteceu uma coisa muito triste. A mocinha ficou doente e faleceu. Meu pai ficou parado por um tempo, depois encontrou outra mocinha e com ela teve 2 filhas, a Juliana e a Ana Cláudia. Aí o casamento desse mocinho com essa mo-cinha também não deu certo e, passou-se um tempo, eles se separaram. Então meu pai encontrou uma outra mocinha e com ela teve mais uma filhinha, que é a Bia. Resumindo eu tenho uma irmão de 33 anos e uma irmãzinha que vai fazer 3 aninhos.

Atividades Preferidas: Gosto muito de sair com meus amigos e tenho ido bastante em baladas. Gostamos de cantar no Karaokê, promover almoços e jantares na casa de um e de outro, vou muito a shows, teatros, cinema. Costumo também ouvir meus cds em casa e escrever sobre bastante coisa, principalmente sobre o cotidiano das pessoas (ao lado encontra-se um de seus textos)

Graduação e Cursos: Sou formada em letras pela UniABC. Este ano quase fiz pós em Jornalismo Cultural, mas meu amigo disse que não era muito a minha cara. Aí eu ia fazer pós de Criação na Comu-nicação, mas não formou turma, então vou deixar para o ano que vem. E curso eu faço de inglês, mas não me dou muito bem. Todo mundo na classe me chama de risadinha porque eu só dou risada. Na verdade, eu sou mais de literatura, gosto de ir em Workshops, manter contato com escritores.

Empresas que trabalhou: Oficialmente eu comecei minha carreira na Teletrim e fiquei uma no lá até que vim para a Dotz, onde estou há uns quatro anos. Lá na Teletrim eu também trabalhava em atendimento, por-que o atendimento da Dotz era feito por eles.

Como entrou na Dotz: Eu entrei aqui convidada. Na Teletrim o Rylson era meu supervisor gerenciado pela Helen. Um dia eu fui trabalhar e os computadores não estavam na mesa, então me disseram que a Dotz não tinha renovado contrato com eles. Isso porque a Dotz estava em crescimento e com a equipe de tecnologia formada. Portanto eles desen-volveram uma plataforma própria e trouxeram o atendi-mento para dentro de casa. Na época eu fiquei bem triste, até quando fui convidada para trabalhar aqui pelo Rylson.

O que esperava e o que espera da Dotz: Eu cresci muito aqui. Alcancei todos os graus, até a posição máxima. Fui atendente, assistente e cheguei a supervisora. Eu espero que a Dotz dê a virada que tanto está buscando e seja bem conhecida. Quero dizer aos outros que trabalho na Dotz e que eles a conheçam.

E o que você fará para isso: Poxa, eu espero continuar dando tudo de mim, acompanhando o ritmo, fazendo com que o atendimento Dotz alcance o grau máximo de eficiência e encantamento, que é o que todos esperam.

Nota 10: Dou nota 10 para o amor, toda forma de amar é bem-vinda e merece ser percebida.

Nota 0: Ao ódio, detesto odiar as pessoas.

No que mais gasta o seu dinheiro: Gasto em tudo o que eu ver. Livros, cds, presentes. Se estou com vontade de alguma coisa vou lá e compro.

Planos pessoais e profissionais para o futuro: Ser uma profissional na área da comunicação, não importa o quê. Mas quando eu falo que quero ser uma escritora tiro um pouco meus pés do chão, porque isso não dá dinheiro. E nos planos pessoais eu não sei porque não pretendo me casar e nem ter filhos. Então, minha área profissional completa a pessoal.

O que você seria capaz de fazer para realizar um sonho: Qualquer coisa que não preju-dicasse ninguém.

Frase predileta: Pode ser um “poeminha” sacana? É do Bukovski, escritor que gosto muito.

“A gente bebe quando está feliz
Pra comemorar
Quando está triste,
Pra esquecer
E quando não tem nada acontecendo,
Pra acontecer.”
Charles Bukovski

Jornalista Responsável: Lílian Munhoz

abril 24, 2005

Poema da necessidade
(Carlos Drummond de Andrade)


É preciso casar João,
é preciso suportar, Antônio,
é preciso odiar Melquíades
é preciso substituir nós todos.

É preciso salvar o país,
é preciso crer em Deus,
é preciso pagar as dívidas,
é preciso comprar um rádio,é
preciso esquecer fulana.

É preciso estudar volapuque,
é preciso estar sempre bêbado,
é preciso ler Baudelaire,
é preciso colher as flores
de que rezam velhos autores.

É preciso viver com os homens
é preciso não assassiná-los,
é preciso ter mãos pálidas
e anunciar O FIM DO MUNDO.

abril 11, 2005

Caminhantes Perseverantes na Cantareira

Uma ótima forma de vencer o cansaço pode ser uma cama quentinha, um lindo sorriso no rosto da pessoa amada quando você chega em casa, uma ducha bem demorada, zapear na TV com o controle remoto e com as almofadas do sofá em meio às pernas e elas, as pernas, beeeeeem esticadas sobre a mesa de centro.

Mas a melhor forma de vencer o cansaço, aquele de caminhar quatro quilômetros e meio com uma mochila pesada nas costas, um baita sol quente brilhando lá em cima e incontáveis subidas íngremes, daquelas que faz qualquer ser normal neste mundo pensar em não encarar, a melhor forma de vencer todo esse cansaço é uma só: a companhia.

Companhia como a San, ligadona no 220 V, rindo e fazendo graça o tempo todo, variando de vez em quando com um papo-cabeça sobre a arte e suas interferências na vida das pessoas, amparada pelos mais inesperados neologismos-tentaculásticos-nishídicos, marcando o caminho com o carisma inexplicável, daquele que somente quem a conhece pode compreender.

Companhia como a Polly, mostrando o tempo todo que a recompensa sempre vem depois do sacrifício, que o topo é o único local de chegada e que vale a pena continuar e ser perseverante. Sempre generosa com todos à sua volta, feliz, e pronta para um sorriso necessário ou para um inesperado "vamu todu mundo dumi" pra quebrar o gelo. Com seus amigos, encara tudo - até mesmo o "filhote de monstro" - que nos ajudou a voltar pra casa com a mochila menos pesada.

Companhia como o Rei, o único entre as mulheres, sempre disposto e solícito para o que precisarem. O protetor da ala feminina, o guardião das amigas, aquele que se preocupa o tempo todo, que se previne, que se dispõe, mas que detesta tirar fotos, ou melhor, sair nelas. O Sansão da turma, cuja força não está nos cabelos, mas nas costas, não importando o tamanho ou peso da mochila. Esse é o nosso Rei!

Comapanhia como a Paulinha, sempre risonha e solidária para com os caminhantes perseverantes. Grande motivadora e articuladora dos momentos de descontração da galera. Sem se preocupar com o que virá depois, está sempre pronta para o que der e vier: uma, duas, três, quatro batidas. E desce mais! Brincando de ser criança no Balanço de Pneus, jura pra todo mundo que não existe fórmula para a sua juventude estampada no rosto. Mas que eu ainda vou descobrir o caminho da Terra do Nunca, ah, isso eu vou.

Companhia como a Marininha, que provou que quem fala pouco anda mais e sua menos. Muito bem prevenida e com um baita espírito aventureiro, salvou a gente das picadas dos insetos e levou seu estoque de ban-daid, caso não aguentássemos a caminhada. Ainda bem que não foi preciso. Eita, mulher guerreira!

Companhia como a nossa Diva que, desta vez, não nos consagrou com sua bela voz, mas contribuiu de montão para o astral da galera. Mostrou-se também bastante comovida com a morte do Papa e, amparada pelo espírito humanista de paz e confraternização no mundo, aproveitou o momento para alimentar os famintos da região - os peixes jurássicos e o "filhote de monstro".

Companhia como a Ana, mestre das artes e do bom português - deixa qualquer analfabeto da língua com UM DÓ por não saber, que vou te contar! Mesmo em estado de choque com a caminhada de uma hora calculada pelo Rei, aproveitou muito bem o momento para exercitar os braços e as pernas nas descidas, enquanto esta que vos escreve capturava imagens pitorescas para refletir o seu olhar. Ohhh! Foi também responsável por preencher o caminho da volta com todo o seu conhecimento e interesse pelas artes plásticas, cinematográficas e literárias.

Por fim, a lembrança dos amigos que não foram também é responsável pela garantia da nossa alegria e cumprimento da nossa meta. Companhias ausentes, presentes nas nossas lembranças. Se estivessem lá, teriam tornado o nosso passeio ainda mais agradável e as subidas menos íngremes.

Viram como comecei minha semana inspirada? Quero que a de vocês também seja assim.

EU AMO O RYL E OS AMIGOS DO RYL!!!!!!!!!!

março 17, 2005

Marco Literário

"Oração das Donas do Inferno". Foi esse o conto que Clarah Averbuck leu no início do seu pronunciamento. O motivo desta leitura? Ela teria que ler algo e, ao tomar emprestado o meu exemplar de "Das coisas esquecidas atrás da estante", era justamente a página deste conto que estava demarcada. Clarah gostou da coincidência e resolveu lê-lo, justificando que provavelmente também o teria escolhido, caso assim tivesse que fazer. Lady Averbuck leu seu conto ferozmente, entonando em sua voz exatamente o que sua linguagem escrita faz sentir.

Ao seu lado estava Marcia Denser - Clarah Averbuck amanhã -, que se emocionou com a performance teatral de um dos seus contos. Marcia leu uma crônica inédita, escrita para alguma antologia que participou, das várias que fez em comemoração aos 450 anos de São Paulo. Como definiu Marcelino Freire, "um encontro a quatro mãos", já que, sucedendo Clarah e Marcia, encontraram-se Marcelo Mirisola e Reinaldo Moraes. Os quatro escritores são estigmatizados como "malditos" e marcaram época porque possuem uma linguagem visceral, revolucionária, chocante.

De quem foi a idéia deste encontro? Só poderia ter sido dele, Marcelino Freire, que também foi curador do "Encontros de Interrogação", promovido em novembro passado no Itaú Cultural, cuja repercussão foi tão boa que teremos segunda edição em 2005. Seguindo a mesma linhagem deste, que objetivava reunir escritores da Novíssima Geração e discutir seu processo criativo, sua literatura e suas referências, o "Marco Literário" também contou com a valorização dos novos escritores, além da organização de oficinas literárias. Aconteceu para reunir escritores de mesmos estilos de uma geração anterior a ícones contemporâneos. Bem à altura de Marcelino Freire, a idéia não poderia ter sido mais criativamente feliz.

O próprio Grande Marça me explicou no restaurante do Sesc Consolação que o "Encontros de Interrogação" foi um imenso passo para se chegar ao "Marco Literário". Mais que eventos literários, tanto um quanto outro tiveram o grande papel de promover a literatura brasileira, aproximar o escritor do leitor e afirmar um cenário literário que, cada vez mais, aparece em constante criação e evolução.

Eventos como esses têm também a responsabilidade de "quebrar" o saudosismo literário nas universidades. Existem novos escritores em cena, a literatura mudou, inovou, está aí para quem quiser ver. A crítica está fazendo o seu papel e os estudantes precisam conhecer a nova literatura na escola e não por acaso, como vem ocorrendo.

O evento ainda não acabou. Hoje, 18 de março às 20h, Joca Reiners Terron, escritor mato-grossense radicado em São Paulo e autor do livro de contos "Curva do Rio Sujo" e do romance "Não há nada lá", encontra pela primeira vez Milton Hatoum, amazonense radicado em São Paulo e um dos principais nomes da literatura contemporânea, autor dos romances "Relato de um certo oriente" e "Dois irmãos".

Amanhã, 18 de março, também às 20h, Luiz Rufato, autor do premiado romance "Eles eram muitos cavalos", encontra pela primeira vez Evandro Affonso Ferreira, que também surgiu nos anos 90 e é autor dos romances "Erefuê" e "Araã!", este finalista do Prêmio Jabuti 2004.

Vai lá:

Sesc Consolação
R. Dr. Vila Nova, 245 - V. Buarque - São Paulo - SP
Tel.: 3234-3009 / 3011-3252

março 13, 2005

Desesperança

O fluxo da vida e suas modernidades -
Perda total do ritmo
Pessoas não reconhecem os passos
Não percebem os caminhos
Não observam as paisagens
Modernidades que retardam o sentir
A percepção só vem depois que a luz se apaga
E novamente encontra dificuldades quando reacende
A subjetividade sobrepõe-se a qualquer grau de percepção
E a vida vai soar numa sinfonia diferente da que se conhece
Sempre incompleta
A luz do mundo vai piscar
De repente, tudo vai ser ainda menos familiar
As portas estarão abertas
Mas a entrada continuará sendo proibida
A linha de chegada é a linha do horizonte

fevereiro 10, 2005

O Homem da Livraria

Cheguei com dificuldades para entrar. Cinco, sete, quinze adolescentes obstruindo a passagem. Por que será que decidiram não entrar? Com licença daqui, com licença dali, uma segurada para não escapar a cara feia, uma leve torcida no nariz e, ufa, entrei. A indagação permaneceu sem resposta: o que será que não atraiu a moçada para dentro da livraria? Será que eles não gostam de best sellers e não entraram em menção de protesto? Será que a sobreposição dos livros não atrai muito a atenção? Ou será que o ar estava frio demais para permanecer lá dentro? Não sei. Sei apenas que entrei e todos aqueles livros pareciam música para os meus olhos e como se eles - os olhos - absorvessem o restante dos sentidos humanos. As mães ajudando os pequeninos a escolher um título parecia a visão do paraíso, uma forma promissora de acreditar no futuro, de não dizer em vão "o Brasil tem jeito".

Olhei à minha volta e existiam apenas três mesas com duas cadeiras cada. Todas elas ocupadas. Fui até a seção de "Literatura Nacional" e peguei com cuidado um livro da Cinthia Moscovitch. Tornei a observar as mesas e ainda estavam ocupadas. Decidi ir até a seção de revistas e a circulei com os olhos, como se buscasse uma maçã bonita em meio a muitas maçãs bonitas. Peguei uma maçã que tinha uma atriz em ascendência na capa. Gosto daquelas edições e já sei de cór o formato do discurso de cada jornalista, podendo, sobretudo, escolher a minha preferida. Assunto fútil com um toque de intelectualidade. É complicado, mas ainda dá pra selecionar bem as futilidades da mídia. Comecei ler a revista em pé mesmo. Folhear não, ler mesmo, desde o editorial até as propagandas mais drásticas. Vou lendo as partes menos envolventes, deixando o melhor pro final, igual criança que come o doce devagarinho, para o gosto bom durar mais tempo na boca.

Olhei em volta novamente e, bem ali, uma cadeira vazia. Fui até lá num passo apressado, torcendo para que aquele moço que vem em minha direção não sente na cadeira antes de mim. Consegui. Cheguei perto da mesa e ele estava sentado, concentrado. Olhei pra ele e pedi licença baixinho, para não incomodar sua leitura. Elegantemente, ele sorriu e fez que sim com a cabeça. Sentei com cuidado, abri a revista novamente e continuei de onde havia parado. De vez em quando, eu sorria ou então me controlava para não comentar em voz alta. Estava compenetrada na minha leitura e em meus pensamentos, quando ele me olhou e aproximou o livro aberto do meu rosto, apontando com o dedo indicador e perguntando: "você concorda com isso?" Fiquei assustada, mas decidi dar-lhe atenção. "Não concordo" - respondi sorrindo. "Isso é truque comercial para alavancar as vendas do livro, e não é a toa que este autor está fazendo fortuna" - concluí. Ele recolheu o livro e, me fitando, respondeu que era isso mesmo. Continuei observando-o e ele se afundou na leitura novamente. Concentrei-me na minha.

Os depoimentos de mulheres que realizaram aborto estavam interessantes, a ponto de eu rever os meus próprios conceitos. Estava dividida entre meus dogmas religiosos e a lei da sobrevivência, quando ele novamente resolveu me abordar: "estamos no princípio do fim e as coisas estão acontecendo exatamente como está na Bíblia. Estava lendo numa revista esses dias e o Brasil possui quatro mil e quinhentas religiões. Isso só no Brasil. Aquele Edir Macedo é a figura dos falsos profetas que a Bíblia ensina. Como é que as pessoas acreditam nisso?"

O que fiz foi fitar aquele homem e apenas observá-lo. Ele continuou: "o mundo capitalista não leva as pessoas a lugar nenhum. Fala pra mim se na época dos militares existia desemprego. O indivíduo somente não trabalhava se era vagabundo. E hoje? Quem é que acredita nessa filosofia enganadora do PT? Se tem alguém que ganha com isso são os banqueiros. Eles emprestam dinheiro às empresas que estão falindo e ganham em cima dos juros. Sabe de quem é o dinheiro que eles emprestam? Meu e seu. Eles têm uma doutrina própria. Coitada da empresa que não se unir a outra. É falência na certa. Observe as empresas de ônibus de São Paulo. Hoje, é tudo consórcio disso, consórcio daquilo. E o país fica aí parado. Eles lançam para o povo a teoria da política do crescimento e é tudo teoria. Tudo enganação pra distrair o povo."

Aquele homem que, quem olhasse, só poderia imaginá-lo alimentando os pombos, estava ali na minha frente lançando o desabafo de milhões de brasileiros com tamanha lucidez. Talvez, qualquer outra pessoa no meu lugar se levantasse da mesa, sem mesmo pedir licença e fosse procurar um canto qualquer para concluir sua leitura. Ou permanecesse com a cabeça baixa, ignorando o pobre homem. Eu, ao contrário, decidi erguer a minha cabeça e ouvi-lo. Simplesmente ouvi-lo. Abosorvi cada palavra como se fosse uma aula acadêmica. Sua teoria sobre a máfia no futebol, a continuidade da sua visão político-social do mundo, a defasagem educacional do brasileiro, a verdade sobre o Carnaval, o Oriente Médio, o Bush, o começo do fim. Para aquele homem, o problema do Brasil se resume em uma única coisa: na falta de patriotismo, algo que vai muito além de conceitos de esquerda ou de direita. Aquele homem que nunca mais verei, que não sei o nome e nem de onde veio. Nem mesmo se era de carne ou osso. O homem da livraria.

fevereiro 05, 2005

Acabo de descobrir uma coisa. Poemas, a gente ouve. Isso mesmo, do verbo ouvir. As belas composições de palavras ficam ecoando na nossa cabeça e a gente fica ouvindo aquela voz lá no fundo. Às vezes é uma voz sutil, daquelas que a gente ouve apenas se prestar muita atenção. Mas às vezes, não. Ela é tão forte que os gritos nos faz ensurdecer. E, de tão forte, a gente precisa colocá-la pra fora, pra ver se, compartilhando, o volume fica mais baixo. Mesmo assim, é um risco. Risco de virar epidemia. Mas eu não me importo e não quero saber de vacina.

A primeira vez que ouvi este poema foi num programa de televisão. A pessoa que o arrancou da cabeça em forma de voz nem sequer parecia gostar dessas coisas. Mas, de alguma forma, ficou um pouco do poema nela. E ficou um pouco em mim. E não adianta fugir, porque vai ficar um pouco em você que está lendo estas palavras agora.

RESÍDUO
(Carlos Drummond de Andrade)

De tudo ficou um pouco.
Do meu medo. Do teu asco.
Dos gritos gagos. Da rosa
ficou um pouco.

Ficou um pouco de luz
captada no chapéu.
Nos olhos do rufião
de ternura ficou um pouco
(muito pouco).

Pouco ficou deste pó
de que teu branco sapato
se cobriu. Ficam poucas
roupas, poucos véus rotos,
pouco, pouco, muito pouco.

Mas tudo fica um pouco.
Da ponte bombardeada,
de duas folhas de grama,
do maço
- vazio - de cigarros, ficou um pouco.

Pois de tudo fica um pouco.
Fica um pouco de teu queixo
no queixo de tua filha.
de teu áspero silêncio
um pouco ficou um pouco
nos muros zangados,
nas folhas, mudas, que sobem.

Ficou um pouco de tudo
nos pires de porcelana,
dragão partido, flor branca,
ficou um pouco
de ruga na vossa testa,
retrato.

Se de tudo fica um pouco,
mas por que não ficaria
um pouco de mim? no trem
que leva ao norte, no barco,
nos anúncios de jornal,
um pouco de mim em Londres,
em pouco de mim algures?
no consoante?
no poço

Um pouco fica oscilando
na embocadura dos rios
e os peixes não o evitam,
um pouco: não está nos livros.
De tudo fica um pouco.
Não muito: de uma torneira
pinga esta gota absurda,
meio sal e meio álcool,
salta esta perna de rã,
este vidro de relógio
partido em mil esperanças,
este pescoço de cisne,
este segredo infantil...

De tudo fica um pouco:
de mim; de ti; de Abelardo.
Cabelo na minha manga,
de tudo ficou um pouco;
do vento nas orelhas minhas,
simplório arroto, gemido
de víscera inconformada,
e minúsculos artefatos:
campânula, alvéolo, cápsula
de revólver...de aspirina.
De tudo ficou um pouco.

E de tudo fica um pouco.
Oh abre os vidros de loção
e abafa
o insuportável mau cheiro da memória.

Mas tudo, terrível, fica um pouco.
e sob as ondas ritmadas
e sob as nuvens e os ventos
e sob as pontes e sob os túneis
e sob as labaredas e sob o sarcasmo
e sob a gosma e sob o vômito
e sob o soluço do cárcere, o esquecido
e sob os espetáculos e sob a morte de escarlate
e sob tu mesmo e sob teus pés já duros
e sob os gonzos da família e da classe,
fica sempre um pouco de tudo.
Às vezes um botão. Às vezes um rato.

janeiro 29, 2005

Alguém aí me ouve? Eu queria falar. Queria falar dos erros que desconheço, aqueles que, se soubesse da existência, jamais teria libertado da prisão. Daqueles que até ouvi gritar meu nome como uma sinfonia sombria, bem ao longe, mas que eu fingi não ouvir e confundi com uma desgraça qualquer que não estava ao meu alcance. Aqueles erros que chegam sem bater, entram sem pedir licença, colocam o pé no seu sofá e ri da sua cara, como se você fosse de fato uma piada, como se rir fosse um seriado engraçado daqueles que continuam no dia seguinte e no dia seguinte e que chegam até a encher, tendo um fim inesperado, num momento jamais imaginado, talvez, encoberto por outro erro. Erros que te deixam com vontade de chorar, de sair correndo, de ignorar a melancolia, que nem um beijo molhado te faz esquecer. Erros que, como o próprio nome já diz, são erros. Erros... Erros.. Erros...

janeiro 27, 2005

A quantas anda a maturidade do Brasil?

Responsabilidade, hoje em dia, está muito aliada à questão de maturidade que alcançamos com o passar dos anos. Está, ainda, estigmatizada à função histórica do ser homem e ser mulher, mesmo com suas controversas.

A mulher, por si só, já amadurece primeiro; a menstruação e o crescimento dos pêlos púbicos acabam antecedendo o crescimento dos pêlos faciais e o engrossamento da voz no homem. Depois, vem a questão da maioridade: até há pouco tempo, o homem se tornava maior aos 18 anos; a mulher, aos 21. Hoje, talvez pela afirmação do papel feminino na sociedade, a questão da maioridade está padronizada. O homem e a mulher assumem sua maioridade cívica aos 18 anos.

Historicamente, socialmente e até logicamente falando, deveria ser assim. Mas como não "entrar em parafuso" quando ligamos a televisão e vemos crianças de 8 e 9 anos de idade cuidando dos irmãos menores e dos afazeres domésticos, enquanto a mãe trabalha fora? Ou, então, trabalhando em zonas rurais, carvoarias e lixões paragarantir o sustento da família? Sim, crianças iguais as que você tem na família e que deveriam estar na escola, atribuindo a sua maturidade ao ato de simplesmente ser criança.

E o Brasil, você e eu nessa história toda? Às vezes, fico pensando naquele adolescente que freqüenta uma escola pública e que não se dá conta das oportunidades que tem em mãos. Penso nos pais destes adolescentes, que não atribuem a devida responsabilidade para o problema. E lamento pelos educadores que vêem seus aprendizados acadêmicos se escoarem pelos vidros quebrados das escolas aonde lecionam.

Há pouco tempo, falei neste espaço da questão da revolução e reafirmo: os jovens de antigamente sabiam detectar os problemas e correr atrás da solução, mesmo que esra se tornasse um problema ainda maior. As pessoas sabiam pensar coletivamente.

Hoje, no entanto, vejo uma juventude com visões míopes. Diante dos meus olhos, o Brasil - um gigante adormecido e imaturo.

janeiro 10, 2005

Dizem que quem canta, seus males espanta. Eu digo mais: quem canta, seus males compatilha e com eles, também a sua alegria, a sua essência, o seu melhor e pior. Não é só isso: quem canta muda a vida de quem ouve. E quem sabe ouvir, tem o dom de proliferar sentimentos. Quem sabe ouvir torna aquele que sabe cantar imortal. E tudo vira música. E tudo vira poesia. E tudo começa a fazer sentido. Assim disse o eterno Itamar Assumpção:

Quem canta seus males espanta
(Itamar Assumpção)

Entro em transe se canto, desgraça vira encanto
Meu coração bate tanto, sinto tremores no corpo
Direto e reto, suando, gemendo, resfolegando
Eu me transformo em outras, determinados momentos
Cubro com as mãos meu rosto, sozinha no apartamento
Às vezes eu choro tanto, já logo quando levanto
Tem dias fico com medo, invoco tudo que é santo
E clamo em italiano ó Dio come ti amo
Eu me transmuto em outras, determinados momentos
Cubro com as mão meu rosto, sozinha no apartamento
Vivo voando, voando, não passo de louca mansa
Cheia de tesão por dentro, se rola na face o pranto
Deixo que role e pronto, meus males eu mesma espanto
Eu me transbordo em outras, determinados momentos
Cubro com as mãos meu rosto, sozinha no apartamento
É pelos palcos que vivo, seguindo o meu destino
É tudo desde menina, é muito mais do que isso
É bem maior que aquilo , sereia eis minha sina
Eu me descubro em outras, determinados momentos
Cubro com as mãos meu rosto, sozinha no apartamento