agosto 30, 2004

Eu me transformo em outras

Muitas vezes, acabo pagando um preço alto por não ser boa observadora. Mas percebo também que, quando observo demais, o desconto não é nada merecedor de algum reparo. É triste, muito triste, você ver um grande ícone da mídia brasileira se mostrar só um pouquinho nada convencional, para as pessoas caírem matando. E olha que eu nem falo da massa crítica profissional. Falo dos verdadeiros críticos mesmo, o povo. Aquele mesmo povo que surpreende quando mostra uma opinião produtivamente formada e que também surpreende, com impacto não menos intenso, quando decide não processar o raciocínio de forma construtiva para denegrir a imagem de alguém. Se é que se pode denegrir a imagem de alguém construtivamente.

Ao sair do show “Eu me transformo em outras” da Zélia Duncan, neste último sábado, o burburinho que se ouvia parecia coletivo. A maioria das pessoas não tinha gostado do show. Se a maioria das pessoas não tivesse gostado do show porque não houve muito investimento na produção ou porque o show atrasou um pouco ou, ainda, porque a cantora não interagiu muito com o público, vá lá. Mas, não. A maioria não curtiu o show por causa do estilo das músicas cantadas e pelo fato de não ter havido espaço para os “Clássicos da Zélia Duncan”.

Posso tecer aí algumas teorias: grande parte das pessoas foi ao show sem conhecer o projeto “Eu me transformo em outras” e acabou se surpreendendo com o que ouviu. Se isso é verdade, posso dizer também que a falta de investimento de material publicitário também teve sua parcela de culpa, logo, esta grande parte das pessoas não é e não pode ser tão ferozmente criticada neste texto. Uma outra possibilidade pode ser o fato de que todas essas pessoas tenham ido ao show porque não tinham nada melhor para a noite de sábado. Está bem, essa possibilidade é bastante razoável. Mas a possibilidade que mais faz sentido em todo este processo crítico é que, infelizmente, a massa social apreciadora de música está corrompida. E digo isso com grande pesar, pois se incluem nesta categoria até mesmo a parte desta massa que aprecia a boa música. Na verdade, não só a boa música, mas também os bons cantores.

Sim, diga aí o que está pensando neste momento. Deixe-me ajudá-lo: “mas que menininha petulante, que não se digna a, sequer, respeitar o gosto alheio. Vem aí, com esse textinho moralista e não tem capacidade de perceber que está se manchando com o próprio veneno. Menininha prepotente, essa!”

Era justamente isso o que se passava pela sua cabeça, né? Pode falar, eu não ligo. Você pode até não acreditar, mas a minha inflexibilidade está bastante controlada. Explico: pode sim ser questão de gosto. Aliás, seria estranho se não fosse, porque eu não iria ao show de um artista que não estimo. Não mesmo. E não me venha dizer também que sou uma tiete simplista e sem noção. Tudo isso faz parte de uma teoria que costumo adotar: não comente sobre aquilo que você não possui um mínimo de conhecimento. E, quando eu digo que gosto de música, eu simplesmente gosto. E tenho a mania de estudar aquilo que gosto, à minha maneira. Para mim, a atitude das pessoas que criticaram o show foi uma atitude superficial, sem conhecimento de causa. Falar por falar, apenas para gerar uma opinião, entende? Eu, particularmente, prefiro ser taxada de “sem opinião” do que de “superficial”.

Se você aí gosta de música, de boa música, se não tem preconceito contra os clássicos e se amarra ver o clássico sendo abordado por um contemporâneo, não perca o show de Zélia. Escute o CD e aprecie. Boa música faz bem à alma. Já a superficialidade, esta me transforma em outra pessoa. Nada agradável, lhes garanto.

agosto 23, 2004

Transgredir de verdade é a solução

O meio artístico está cheio de figuras marcadas por uma personalidade forte e por altas dosagens de transgressão. Diante de termos como este, imaginamos um filhinho de papai armando a maior baderna na televisão e influenciando milhares de jovens Brasil afora. Vá lá, não é mentira. Mas é bem verdade também que toda época tem os seus ícones conturbados. Abra uma revista qualquer ou ligue a televisão e você encontrará inúmeras Britneys Spears causando no meio musical, milhares de Dados Dolabellas no meio artístico e intermináveis Fernandas Yongs no meio literário.

Certo, podemos tirar boas perspectivas de tudo isso, afinal, toda época é brindada com tipos que vão contra a corrente. Falo dos famosos transgressores. E, nesse mundo aonde ninguém é de ninguém e todo mundo é igual mas é diferente, transgressor é o adjetivo que a maior parte da nossa classe artística quer carregar a tiracolo. E a problemática disso tudo - sim, porque existe uma problemática -, fica em torno do significado das coisas. Ser transgressor é, antes de tudo, uma responsabilidade. Uma grande responsabilidade. Não é aparecer na mídia e utilizar-se do seu poder para subverter os fracos e oprimidos.

Ser transgressor não é ditar moda. Fazer uma tatuagem ou colocar um piercing no nariz. Tatuagens ou piercings não expoem causas. Transgredir é ir contra, construtivamente. É oferecer uma ideologia. É abrir os olhos da sociedade. Falo do bom transgressor, daquele que faz e que fica.

Transgressores hoje são confundidos com rebeldes sem causa. Muito diferente dos transgressores de ontem. O indivíduo vai, escreve um bilhete de cunho preconceituoso contra todos os nordestinos que vivem na Selva de Pedra, entrega nas mãos de um pobre coitado e pronto. Acha que sua revolução está travada. Este, senhoras e senhores, é um falso revolucionário. Diferente dos jovens que lutaram contra a ditadura na Era Vargas. Diferente dos jovens que passaram suas mensagens por meio da música e foram censurados. Diferentes de espíritos como o meu, como o seu, que me lê agora.

Quando eu falo que a juventude brasileira está corrompida, não minto. Mas também não minto quando penso que ainda há esperanças. Que ainda há boas músicas, bons livros e bons justiceiros. Façamos das nossas crenças a nossa voz, o nosso grito. Vamos compartilhar a nossa sensatez e destruir a hipocrisia. Vamos fazer arte na cabeça dos nossos jovens. Vamos combater os falsos moralistas. Quem se habilita?

agosto 16, 2004

Por que as pessoas vão ao cinema?

Pelo mesmo motivo que as impulsionam a ouvir uma música, você pode dizer.

Por ser um hobby tecnicamente construtivo, capaz de abstrair as futilidades da vida ou de transformá-las, dependendo do ponto de vista.

As pessoas também podem ir ao cinema para se ver sozinhas. Para fugir do mundo que as cerca. Ou para fugir de algumas pessoas. Ou ainda, para fugir com uma pessoa. Uma só.

Para sonhar, sem se importar com a realização. Fechar os olhos e se imaginar caminhando num belo campo coberto de flores silvestres, livres de pensamentos ruins, das maldades que nos cercam, dos espíritos corrompidos. Ou nuas, numa cama forrada com lençóis brancos, acompanhadas pela Nicole Kidman ou pelo Gael Garcia Bernal.

Talvez as pessoas entram na sala escura e sentam-se em frente à grande tela com a intenção única de se transformar. E ninguém termina de ver um filme sem um mero grau de transformação.

Respostas. As pessoas também podem ir ao cinema em busca de respostas. Significados. Justificativas. Elas desejam compreender o amor, explorar o amor, absorver a visão dos cineastas. Compreender a guerra também é outra possibilidade. Talvez as pessoas queiram encontrar culpados. Ou se descobrir culpadas. Existem boas almas que se preocupam com isso.

Projeções. Sim, o cinema também permite ao indivíduo projetar a sua vida. Desenvolver um objetivo. Oferece um ponto de partida, um apoio para o primeiro passo.

O principal motivo que leva as pessoas ao cinema é o auto-conhecimento. O estado de meditação a que recorrem entre uma cena e outra. Entre uma pipoca e outra. A reflexão de um sorriso inesperado, de um comentário baixinho entre o casal do lado. De analisar uma história para poder comentá-la depois. Para recomendar a uma pessoa querida.

As pessoas vão ao cinema porque o cinema é arte. Para quem faz e para quem aprecia. Porque, ao contrário do medo social, a juventude não está corrompida por completo. O cinema salva, assim como a música. Assim como os livros.

agosto 12, 2004

Hein?

A soma dos preconceitos é igual ao quadrado da ignorância multiplicado pela hipocrisia da sociedade. Seria o preconceito uma questão de cultura? Ou será que seria apenas uma complicada questão de educação de berço? Ou, ainda, um distúrbio psicológico, daqueles que nem Freud explica? Hein??

agosto 03, 2004

Criticando a Crítica

Em épocas como a nossa, com toda uma expansão tecnológica, uma diversidade cultural cada vez mais em evidência, com uma forma de pensamento muito diferenciada do convencional, do clássico, do politicamente correto, surgem conceitos no mínimo interessantes sobre a forma de se ver a vida e, sobretudo, sobre a forma do gostar e não gostar, do aceitar e não aceitar, do querer e do não querer, do ser e do não ser.

As pessoas tornam-se críticas umas das outras sem ao menos entenderem o verdadeiro significado de ser crítico. Mas isso é bom? Não, senhoras e senhores. Definitivamente, não é. Hoje em dia, fala-se muito e desconhece-se este muito de que se fala. Não existe relação entre a crítica e o assunto criticado e, por mais que esta minha idéia se designe a uma visão unilateral, insisto em dizer que não é.

O que é muito comum hoje em dia é ver a crítica tecida afastar o crítico do assunto principal e aproximá-lo da sua essência. Conseqüentemente, descobrimos uma sociedade fútil, superficial. Vivemos num mundo de plástico. E se você não está captando esta minha mensagem, tenho algumas dicas que facilitará a sua compreensão: acesse alguma comunidade do tão falado Orkut, dê uma navegada em alguns muitos blogues por aí, leia aqueles e-mails que circulam por nossas caixas-postais em formato de correntes, ouça um pouco a conversa do fulano de trás no coletivo, assista um capítulo de uma novela qualquer.

Não adianta, não há como fugir. Críticas superficiais já fazem parte da nossa cultura e caminhamos cada vez mais para dentro dessa cultura imprópria. Estamos nos afogando em detalhes sórdidos. Alguém precisa resgatar certos valores, certos comportamentos. Aceitar o novo, mas não ignorar o velho, manja? Aprender com o velho. Aprimorar o velho. Precisamos colocar propriedade em nossos argumentos. Precisamos merecer ser ouvidos. Senão, os nossos gritos serão em vão. A nossa juventude não vai ficar como ficou as juventudes passadas. Não seremos lembrados por bons motivos, por grandes feitos. Precisamos intelectualizar os nossos jovens. Alguém aí me ouve? Façam eco deste meu lamento.