abril 19, 2004

A arte de não expandir

O que você quer? Que eu me converta em off para o mundo? Que eu me tranque no fundo do seu quintal? Que eu me esconda para sempre atrás da sua cortina? Que nunca mais na vida ligue a televisão? Que eu afogue meu radinho à pilha no seu vaso sanitário? Na sua presença, para não restar dúvidas? Ah, então você quer que eu desacredite na índole da multidão? Que eu pense que o azul não é mais azul? E que o arco-íris nunca foi colorido? Quer que eu acredite no seu conceito de inteligência? Na sua unilateralidade? Você acha mesmo que o mundo foi escrito em uma só língua? Ah, sei, você acha mesmo que isso que faz é literatura? E que eu sou mesmo tão santa como você havia previsto? Nunca ouviu falar em transgredir, não? Acha mesmo que essa sua vidinha regrada me satisfaria? Você sempre duvidou desse meu egoísmo, né? O que você pensa, que a felicidade é eterna, é? Que o gnomo do seu jardim lhe é fiel? Que todas as menininhas nascem virgens? Que o mundo é uma grande bolha rodeada de sexo, drogas e rock'n roll? Você acha mesmo que Freud é o senhor único da psicanálise? Tá, e você nunca ouviu falar em revolução? Que um único filme pode ser dirigido por mais de uma pessoa? E que um escritor nunca escreve um livro sozinho? Que a solidão é boa, sim, muito boa? O seu problema é não enxergar que o mundo é uma grande interrogação.

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